sábado, 12 de março de 2011

Bruna surfistinha - Crítica de Cinema na Rede


O sentimento de inadequação pode levar algumas pessoas a mudar de vida radicalmente. E este sentimento não está só relacionado à fase de adolescência, como costumamos pensar, podendo acompanhar uma pessoa desde sempre. Esse foi o caso de Raquel, personagem de Deborah Secco, no longa Bruna Surfistinha, de Marcus Baldini, baseado na autobiografia O Doce Veneno do Escorpião.
Embora Raquel tenha decidido abandonar a família em torno dos seus 18 anos, o sentimento de estar no lugar errado parecia mais antigo e éevidenciado pela tensão estabelecida, principalmente, na sua relação com o irmão. Na escola, Raquel se encolhe (demonstrado pela postura da atriz, arqueando os ombros sempre para frente e para dentro), numa tentativa de não ser notada, de não ser vista como alguém que não deveria ou merecia estar ali. E, ao mesmo tempo em que sua atitude provoca o afastamento dos demais adolescentes, faz a própria Raquel sofrer por nunca se sentir desejada, incluída...
O desejo, de ser querida e de descobrir a liberdade, leva Raquel a fugir de casa e se apresentar num bordel para trabalhar como garota de programa. Mas, seu desejo vai além de ser dona da própria vida – o que faz sentido se pensarmos no sentimento de solidão de uma órfã adotada como ela –, é um desejo de provar para o mundo que ela existe. E não há nada melhor, numa sociedade conservadora como a nossa, do que uma mulher fazer sexo em troca de dinheiro para mostrar que pode fazer o que bem quiser.
Dessa atitude de trabalhar com raiva do mundo e prazer em fazer sexo, nasce Bruna Surfistinha, codinome construído por ela e atribuído a ela pelos seus fiéis clientes e leitores de seu comentado blog. Bruna é exatamente aquilo que Raquel gostaria de ser e, claro, saindo de um extremo ao outro, Raquel vai do anonimato a celebridade como Bruna, se regalando com seu sucesso e sofrendo com as consequências de se entregar a um amor próprio desmedido e sustentado apenas pela fama.
Então, Raquel se afasta de sua amiga e companheira de trabalho Gabi e passa a se relacionar com pessoas envolvidas com drogas, o que leva a garota de programa ao consumo de cocaína e a uma fase de autoflagelação intensa até ser amparada por Hudson, um antigo cliente que acaba se apaixonando por Raquel (a pessoa que ele acreditava estar escondida atrás da personagemBruna) e pede a ela que deixe de trabalhar fazendo programa.
Embora esta última descrição pareça arrematar uma história difícil com um final feliz, o diretor faz um pouco mais que isso: traz à tona – com sensualidade, corpos nus e um tanto de realismo – alguma reflexão sobre a sexualidade, não só de Raquel/Bruna, mas de todos nós.
Ainda, o filme acredita valorizar a independência dela como mulher e como profissional. Na verdade, acaba reforçando uma imagem de fragilidade e frivolidade que tem, ironicamente, muito de machista.
Afinal, enquanto a sociedade separar as mulheres entre santas e putas, haverá cada vez mais vagas para garotas de programa
(Monica Lobo)

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