quarta-feira, 2 de fevereiro de 2011

Sex and the city II

Um filme do qual não adianta falar bem ou falar mal. O público-alvo é tão específico e cativo que convencer alguém a assistí-lo ou não é tarefa das mais difíceis.

Como a série televisiva, neste segundo filme fica mais escancarado o desejo de entregar às mulheres de sua platéia o sonho escapista de uma vida luxuosa, em que homens maravilhosos e férias grátis podem simplesmente cair do céu. Um conto de fadas para a sociedade de consumo, em que uma fada madrinha em forma de sheik árabe resgata mulheres das "agruras" de ser mães e esposas para levá-las ao mundo encantado do Oriente Médio, cheio de possibilidades e mistérios.

A escritora Carrie já está com dois anos de casada e prestes a lançar mais um livro, mas começa a perceber sinais de rotina no casamento, o que para ela é inadmissível. Charlotte desconfia que está sendo traída pelo marido, além de estar cada dia mais estressada por cuidar de duas filhas. Miranda resolve largar o emprego e cuidar mais da família, mas isso não é exatamente o que ela quer. Samanta vive a crise da menopausa, mas tenta manter o vigor na marra, à base de muito hormônio eaproveita-se de uma viagem a negócios para os Emirados Árabes e resolve levar as amigas para serem bancadas por alguns dias por um sheik árabe.

O roteiro abusa de piadas infames e batidas e investe em micos pagos pelas protagonistas, especialmente na segunda metade do filme, quando situações esdrúxulas tiram qualquer possibilidade de profundidade, descambando para um final piegas e mais que previsível.

Há todo um discurso da direita norte-americana escondida por baixo das saias esvoaçantes de Carrie Bradshaw e isso nem chega a ser novidade. Desde 1998, quando o seriado estreou nos EUA, até hoje, muitas foram as teses acadêmicas escritas sobre as quatro amigas que moram em Nova York. Todo um novo modelo de consumismo feminista estava ali exposto e calcado na presença já consolidada da mulher no mercado de trabalho. E, apesar de pregar a liberdade e autonomia femininas, evidenciadas em atitudes desapegadas com relação a sexo e família, muito do que a figura de Carrie representa é a liberdade de consumir.

Nos dois episódios cinematográficos de Sex and the City a ação segue a mesma linha narrativa de sua vida na televisão. A única coisa realmente ampliada é a esquizofrenia do luxo, cujo melhor exemplo são os figurinos de cada uma das personagens. E por falar em esquizofrenia, a personagem de Sarah Jessica Parker desempenha o papel que melhor expõe essa questão, seja através de suas roupas, seja através de uma psique bastante confusa, que combina anticonvencionalismo e conservadorismo na mesma figura.

Os roteiristas usaram um baita casamento gay para falar de liberdades civis, e também para que Liza Minnelli protagonizasse uma versão de Single Ladies, numa das cenas mais engraçadas e constrangedoras do filme. Logicamente, um casamento gay não seria apenas lugar para celebrar essa liberdade, mas toda a tal esquizofrenia do consumo e das interferências do universo pop mesmo no mais tradicional dos eventos.

À medida que o luxo da viagem ao Oriente se desenrola, a esquizofrenia do consumo aliada ao conservadorismo das nossas, agora cinquentonas, amigas novaiorquinas pode ser revelado a cada troca de roupa e a cada detalhe da viagem, que sugere com singeleza questões tão seriamente preconceituosas como os contrapontos quase infantis entre o Oriente como lugar de tradições massacrantes e os Estados Unidos como terra da liberdade.

Fora isso, luxo e cafonice se confundem, como sempre na série: a cena do karaokê, que apesar de piegas, não pareceria tão distante da realidade se a mensagem que a canção sobre ser mulher e superar obstáculos não estivesse tão distorcida ao longo do filme. Chega a ser engraçado notar que durante às quase duas horas e meia de filme as personagens protagonizem diálogos que demonstram um feminismo de butique, que culmina com uma mulher pedindo perdão ao marido com um beijo nas mãos e um anel caríssimo envolvido.

Entendemos que Carrie viva num mundo diferente do que a maioria de nós, e é super divertido vê-la deslizando roupas inimagináveis para situações cotidianas reais. O grande perigo nessa história toda é esquecer que ela é apenas um personagem que hoje já não condiz com a realidade política e econômica de seu país. Por isso mesmo, todo o discurso sobre colecionar Manolos Blahniks e ter uma coluna na Vogue América parece tão surreal que chega a ser divertido.

Enfim, os detratores vão destacar a superficialidade que sim, permeia a história das quatro amigas, moradoras de Nova York, vendedoras sôfregas da imagem de sexualmente bem resolvidas, consumistas e lançadoras de tendência que ultrapassaram a ficção.

"Mesmo que o filme seja terrível, as mulheres não ligam", disse um analista de bilheterias da Hollywood.com. "É um evento..., e acho que para muitas mulheres é o seu 'Guerra nas Estrelas'. Essas são as personagens que elas amam."

Tão "perdidas" quanto elas, no mundo de hoje...

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